sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

A minha pátria, que língua é?

Quem lida, como eu, com várias línguas, talvez me possa confirmar esta teoria: uma pessoa transforma-se quando fala noutra língua.
Já tive algumas vezes a seguinte experiência: habituada a falar com alguém, por motivos profissionais, sempre numa determinada língua, ao fim de algum tempo julgo conhecer essa pessoa (no sentido de que sei o que esperar dela nos contextos em que nos cruzamos). Mas não. O que eu conheço é aquela pessoa naquele registo. Depois, por alguma razão, um dia, ouço a mesma pessoa a falar outra língua e, de repente, estou perante um desconhecido. A razão obriga-me a manter a familiaridade adquirida, mas emocionalmente estou cheia das inibições de quem está no processo de conhecer/descobrir alguém, misturadas com a supresa de ver a mesma forma com um recheio diferente. (É parecido com a sensação de, num filme dobrado, ouvirmos um actor que conhecemos bem, com outra voz, e a falar outra língua).
É surpreendente e nem sempre é bom. Já me aconteceu achar que simpatizava com alguém com quem falava sempre em inglês e, um dia, ouvi-a falar em português e fiquei horrorizada porque era uma tia de Cascais.
Agora dizem-me: ah, mas a língua é só um meio, e o que está por detrás não se altera. Pode não se alterar, mas a língua arrasta consigo uma atitude, uma visão do mundo, e mostra talvez um lado nosso que noutra língua poderá não estar visível. A tal senhora de que falei talvez não dominasse um sotaque snob em inglês, ou talvez não lhe fizesse sentido mostrar o seu lado snob quando fala inglês.
Pronto, mudo a teoria: a língua que falamos não nos transforma, mas mostra algo de nós que poderá não ser visível noutra.

P.S.: Quero ver este filme.

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